sábado, 23 de janeiro de 2010

Solidão compartilhada

A solidão não precisa ser tratada como se fosse uma sensação ruim. Muitas vezes ela permite desenvolver algum tipo de atividade positiva. O ócio é abordado na revista Filosofia Ciência & Vida [edição 12] como um momento proveitoso e de possível criatividade. "Sem uma disponibilidade de tempo, sem certa ociosidade, você não tem como criar. Não só para filosofar, mas descansar", afirma o filósofo Daniel Leandro Gonzales. A solidão pode ser ainda uma celebração da própria vida, na medida em que se atribui sentido, prazer e uma série de condições e valores. Gonzales relembra ainda que o escravo grego não tinha tempo livre, sozinho, e que sem esse ócio as pessoas não tem tempo para arranjar soluções para o mundo atual e para suas próprias vidas. "Precisamos pensar em como solucionar os problemas, e hoje estamos perdendo essa condição", finaliza.

A luguel de amigos

O modo com que as crianças são criadas pode influenciar na tarefa de desenvolver as "memórias de companhia" e reduzir sua capacidade de sentir-se bem com a solidão quando adultas

Lívia Gomes desenvolveu sua dissertação de mestrado sobre as semânticas da amizade e suas implicações políticas. "A perversão da amizade em mercadoria comprável revela um sintoma extremamente sério de brutal desqualificação e degradação das relações afetivas, um cenário gravíssimo de mortificação da condição de humanidade", ensina a psicóloga social.

"Contudo, esse contexto gritante de aviltamento da afetividade, de impiedoso desgaste do tecido afetivo, soa apenas como mais um efeito banal em tempos de abundância da violência", observa a especialista, inserindo sua tese no tempo presente. "A depreciação da amizade e a cotidiana banalização do outro revelam uma degradante situação de carnificina da alteridade, que pode ser indicada nas novas e alarmantes modalidades de capitalização da amizade", completa.

O desvirtuamento da amizade tem, para a psicóloga, assumido contornos impressionantes. Ela lembra que, em maio de 2009, o site iG anunciava: "Se você não tem amigos e sofre com a solidão, seus problemas acabaram! Agora já é possível contratar um amigo para estar sempre ao seu lado".

De acordo com Lívia, a chamada era para um serviço intitulado "Amigos de Aluguel" que, por si só, já indicava ser possível alugar um amigo como companhia para os mais inusitados passeios, eventos, viagens e baladas.

"O site Amigos de Aluguel é apresentado como solução para os solitários, bem como para os jovens tímidos com dificuldade de se sociabilizar que podem 'alugar um amigo', por cerca de R$ 15,00 reais a hora, caso queiram conversar com alguém, tenham uma festa para ir, ou estejam cansados de almoçarem sozinhos", esclarece a especialista.

Segundo a psicóloga, "a absurdidade do aluguel de amigo é da ordem do vilipêndio ao cogitar que a amizade tem preço". Ora, a palavra aluguel pressupõe tempo e preço determinados que não condizem com a gratuidade e generosidade próprias do gesto de amizade. A semântica da amizade concerne a um vínculo de diálogo numa condição de igualdade política, ou seja, o amigo é aquele com quem se pode conversar abertamente em uma relação horizontal, baseada em estima e confiança conquistadas, não entregues mediante o pagamento do contratante ao contratado".

Além disso, ela pondera: "a qualidade política da amizade designa um vínculo aberto de experimentação, cuja imprevisibilidade e indeterminação não condizem com a rigidez da relação contratual, que impõe condições prévias de agendamento, roteiro, orçamento e depósito em conta bancária".

Para Lívia Gomes, essa prática traz ainda um caráter perverso, pois forja uma solução para solitários que têm dificuldade de se rela- cionar. "Contratar uma companhia temporária não resolve as questões relativas à sociabilidade.


"A solidão pode se tornar um proBlema para os indivÍduos que não conseguem permanecer Bem consigo mesmos, quando sozinHos ou atÉ 'na multidão"

Aqueles que sofrem com solidão, inseguranças, timidez devem procurar solucioná-las com a ajuda de um profissional qualificado para tra- balho de acompanhamento psicológico em que se busca o sentido destes problemas".

Trabalho e PolÍtica Segundo John Cacioppo, solidão refere-se à percepção pessoal de isolamento social, estando o indivíduo, ou não, ao redor de outras pessoas. Desta forma, também no ambiente de trabalho, uma pessoa pode sentir-se isolada dos colegas, enquanto outra, na mesma situação, pode sen- tir-se conectada.

A amizade, segundo Lívia Gomes, além de me- lhorar a qualidade das relações e a produtividade das pessoas, reduz o estresse no ambiente de trabalho. "A relação de apoio entre os amigos trabalhadores é fundamental para a saúde mental e para a proteção de doenças, pois um ambiente tenso - no qual há predomínio de relações hostis e de competitividade - pode produzir uma série de doenças", afirma.

A psicóloga ressalta que "o apoio de amigos, a companhia dos outros, aparecem nos discur- sos como sendo fundamentais nas práticas de cidadania, nos momentos em que o lutar junto dá o tom na busca pela realização de interesses coletivos". E conclui: "Os resultados demons- traram que a relação de amizade contribui com movimentos coletivos de resistência e cidadania, precisamente porque ela implica ajuda mútua entre amigos, possibilitando a formação de laços de parcerias e engajamento político.

Internet não é vilã

Dados do IBGE, coletados em 2006 em parceria com o Comitê Gestor da Internet (CGI.br), mostram que 32,1 milhões de pes- soas acessaram a Internet pelo menos uma vez no Brasil.

Os internautas tinham em média 28 anos de idade. Sessenta e oito por cento das pes- soas usaram a ferramenta para se comunicar com outras pessoas, a segunda maior moti- vação para o uso da Internet, ficando atrás apenas de Educação e Aprendizado (71,7%).

Mesmo sabendo que cada vez mais pes- soas usam a Internet para se comunicar, ela ainda é vista por muitos como incentiva- dora do isolamento social e formadora de laços frágeis.



Rede social


A febre do momento, em termos de redes sociais, é o Twitter. Trata-se de uma rede social livre e de micro- blogging, serviço que permite aos usuários enviar e ler mensagens conhecido como tweets. Tweets são baseados em textos-mensagens de até 140 caracteres exibidos na página do autor do perfil e entregues aos assinantes do autor, que são conhecidos como seguidores. Remetentes podem restringir a entrega para aqueles em seu círculo de amigos ou, por omissão, permitir o acesso aberto.

Os usuários podem enviar e receber tweets via o site Twitter, Short Message Service (SMS) ou aplicações externas. Tudo, claro, de graça.



Revista psique

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